01 junho 2007

Covardia.


Ricardo Gondim.

Depois de muito lutar para conseguir superar meus medos, depois de fatigado e curvado pelo esforço de me tornar um Cavaleiro Andante, reconheço: sou um medroso.

Percebi minha covardia depois que somei as vezes que já me escondi; depois que lembrei os dias que não consegui olhar direto nos olhos de minha mãe; depois que dei o braço a torcer por ter passado nos exames do ginásio desonestamente – eu odiava ter que ouvir qualquer desapreciação do meu pai; depois que admiti que minhas taras adolescentes me alienaram do mundo.

Fui vagaroso nessa auto-análise porque sempre consegui fugir de minha realidade por escadas de incêndio, minhas rotas de fuga. Assim, de pouco em pouco, fui me escolando na arte de esgueirar-me por entre estranhos e de passar despercebido.

Sinto-me acovardado diante dos paradoxos que convivem dentro de mim. Sou uma encarnação cearense do “Yin e Yang”. Se em determinados momentos tenho impulsos fidalgos, em outros me comporto como a escória da humanidade; gero horror e esperança; produzo cura e morte, desprezo e amor.

Atemorizado diante da grandiosidade das forças que me esticam por dentro, escondo-me atrás de chavões piegas, refugio-me na fama de preletor onipotente, solidifico meus traquejos sacerdotais, e subo o volume dos decibéis quando vocifero sobre a verdade. Mas essa coreografia não passa de uma farsa que tenta camuflar um homem fraco que sua no instante de decidir entre o certo e o errado.

Sinto-me acovardado com os retrocessos que não me permitem amadurecer como pessoa. Quanto mais velho, mais tropeço com minha língua, falo inconveniências; continuo displicente em não saber elogiar as pessoas que tanto amo; permaneço um bronco sem perceber os reclames daqueles que só desejam minha companhia. Fujo dos meus amores. Timidamente interrompo a grandiosidade do afeto de meus queridos.

Aprendi a desfilar diante das multidões impessoais que jamais me confrontariam em nada; sinto-me à vontade em ambientes onde só se discutem idéias; mudo de assunto quando alguém está perto de desencaixotar o farsante que vive nos porões de meu espírito.

Sinto-me acovardado com a possibilidade de perder minha reputação. Tenho horror de imaginar que possa ser motivo de conversa em alguma roda de restaurante. Fico tremendo de saber que algum crítico conseguiu desmontar-me. Medroso, esforço-me por manter-me ambíguo, prefiro não ser claro sobre minhas posições heterodoxas. Fico petrificado de poder ser “escanteado” pelos meus antigos amigos.

Mereço a maldição do Apocalipse de ser vomitado da boca de Deus. Fico mais alarmado de ser frio ou quente do que um morno que coxeia entre dois caminhos. Lamento que muitas intuições minhas jazerão eternamente em algum arquivo morto. Elas sumirão comigo só porque jamais terei peito de defendê-las entre aqueles que poderiam se escandalizar.

Sinto-me acovardado sempre que sou forçado a arriscar diante de algum projeto. Tenho plena consciência de que em toda façanha, quando fui arrojado, só me comportei assim porque alguém – ou alguma coisa? – me empurrava. Pusilânime e sem topete para sequer dizer não, continuei liderando.

Hoje aquiesço que nunca me vi como nenhum D’Artagnan ou Ricardo Coração de Leão. Quando me dei bem na vida, foi por causa de Deus, da minha mulher e dos meus amigos - ou por pura sorte.

Continuo acovardado. Preciso de gente que me estimule, me encoraje, me ajude e me segure pela mão.

Não arrisco dizer quando me transformarei em valente. Sei apenas que, aos tropeços, cheguei aqui.

Soli Deo Gloria.

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